As disputas por terras entre os estados do Ceará e do Piauí remontam ao período colonial,
quando o Piauí, na condição de capitania do Maranhão, passou a requisitar as terras da Missão
de Ibiapaba, que constavam como território cearense. Em 1761, foi expedida uma Ordem
Régia que determinou essas terras como pertencentes ao Ceará. No século XIX, as desavenças
territoriais reacenderam após o Ceará ocupar as terras da comarca de Amarração, no território
piauiense. O Piauí realizou vários protestos contestando junto às autoridades imperiais a posse
sobre essa localidade. Na tentativa de solucionar o impasse, D. Pedro II promulgou o Decreto
nº 3.012, de 22 de outubro de 1880, que transferiu para o Piauí as terras de Amarração e
concedeu ao Ceará a freguesia de Príncipe Imperial. Ainda que selado o acordo, as
divergências territoriais entre as partes não foram sanadas, ao passo em que, atualmente, a
fronteira entre o Ceará e o Piauí abriga um litígio de aproximadamente 2.800 km².
Considerando-se essas conflitualidades, este estudo propõe uma discussão sobre os limites
interestaduais no Brasil, com ênfase no litígio territorial existente entre o Ceará e o Piauí,
ambos situados no Nordeste brasileiro. A fim de atender a tal pretensão, definiu-se como
objetivo analisar os fatores que implicam na permanência da questão litigiosa entre os estados
do Ceará e do Piauí. Para chegar a tal fim, buscou-se: discutir como as constituições
republicanas versaram sobre as questões de limites interestaduais; compreender a gênese dos
condicionantes que levaram à indefinição dos limites entre os estados do Ceará e do Piauí;
entender como as instituições deliberativas e os institutos de pesquisas que se dedicam aos
estudos territoriais têm dialogado para o desenrolar desse litígio; identificar os aspectos
sociais, econômicos e infraestruturais dos municípios envolvidos no litígio. A metodologia
utilizada consistiu em um estudo de caso que permitiu fazer uma revisão de literatura sobre a
temática proposta; analisar as constituições republicanas; entrevistar as instituições
deliberativas e institutos de pesquisas envolvidos no litígio; analisar os discursos contidos em
matérias jornalísticas; observar o posicionamentos das representatividades cearenses e
piauienses, diante das audiências públicas realizadas para discutir essa divergência litigiosa;
estudar as potencialidades econômicas da Serra da Ibiapaba e consultar os indicadores sociais,
econômicos e infraestruturais dos municípios inseridos no litígio. A metodologia adotada
nesse estudo permitiu compreender que o conflito de terras entre o Ceará e o Piauí,
atualmente, fundamenta-se em questões de ordem econômica, política e fiscal. Em termos de
economia, evidencia-se na Serra da Ibiapaba o potencial agropecuário, turístico e a entrada de
capital para investir em energia eólica. Em termos políticos, visa-se à ampliação e/ou
manutenção de poder político, uma vez que a população representa aumento da quantidade de
votos, aumentando as possibilidades de levar as lideranças políticas locais e estaduais ao
poder. Em termos fiscais, nota-se a disputa por recursos financeiros oriundos de repasses do
governo federal e o aumento da capacidade arrecadatória dos municípios, ambos
influenciados pelo tamanho da população. A ação conjunta dos fatores econômicos, políticos
e fiscais acirra as disputas pelas terras da Ibiapaba e implica na permanência do litígio de
terras entre o Ceará e o Piauí.