Esta pesquisa apresenta uma investigação acerca do ser feminino e a experiência
da morte na obra Água Viva [1973]/(1998), de Clarice Lispector, e as reverberações
de suas traduções em língua inglesa, publicadas como The Stream of Life (1989) e
Água Viva (2012). Assim, investigamos como os debates sobre o ser feminino e a
sua ligação com a morte foram construídos na referida obra, a fim de evocar uma
discussão literário-filosófica da constituição do sujeito feminino na narrativa.
Consideramos, ainda, como os agentes de tradução, que se preocuparam, nos
séculos XX e XXI, com a popularização da obra de Clarice Lispector, manipularam
seu texto a fim de reverberar dele suas próprias vontades de verdade. De tal
maneira, para compreender a constituição ontológica do ser e como a mulher
merece maior atenção por estar à margem do protagonismo dos debates filosóficos
ao longo dos séculos, trabalhamos com a filosofia da existência de Martin Heidegger
(2005 e 2018); a filosofia pós-estruturalista de Gilles Deleuze (2011), Félix Guattari
(1995) e Jacques Derrida (2006 e 2013); o pensamento sobre as noções de mal do
filósofo Georges Bataille (2016 e 2017); assim como as postulações filosófico-
feministas da filósofa Hélène Cixous (1990 e 2017). Os Estudos da Tradução e de
Recepção estão representados, no aporte teórico deste trabalho, por Maria
Tymoczko (2000 e 2013), Mona Baker (2018) e por Hans Robert Jauss (1979). Para
tratar da escrita de Clarice Lispector, que compactua em sua própria tecitura com a
formação do sujeito feminino para a morte, trouxemos para o escopo teórico Maria
Lúcia Homem (2011), Yudith Rosenbaum (2006) e Marília Librandi (2015).
Pressupostos da Teoria Feminista estão representados neste trabalho pela por meio
de Silvia Feredici (2017) e Rita Terezinha Schmidt (1981). As conclusões apontaram
que a escrita clariceana, no que tange às problemáticas deste trabalho, demonstrou
dois movimentos importantes: quanto aos aspectos de tradução, concluiu-se que o
texto-fonte evoca a permanência de seus efeitos de recepção, mesmo crivado pelo
poder dos agentes tradutórios; e, referente à discussão do ser da mulher,
asseverou-se que este “não-lugar” é evidenciado pela simbologia da morte,
catalisando para a presença feminina imanente transgressão, uma vez que a
experiência de sua socialização é diferente da dos homens, visto que experimentou
simbólicas perseguições por sua diferença do conluio patriarcal. Assim, a morte e
seus símbolos atuam na experiência interior feminina como pressuposto também de
quebra e de liberdade.