O Diabetes Mellitus (DM) é um distúrbio metabólico associado a níveis elevados de glicose sanguínea. O DM leva a complicações, incluindo a disfunção da bexiga diabética (DBD) ou cistopatia diabética, uma condição presente em mais de 50% dos pacientes diagnosticados com DM, especialmente em estados crônicos e não controlados terapeuticamente. As alterações miccionais consistem em diversas manifestações clínicas, como hiperatividade e hipoatividade do músculo liso detrusor. Durante estados de hiperglicemia, ocorre elevação dos níveis de compostos dicarbonílicos, como o metilglioxal (MGO), e aumento na geração de produtos finais de glicação avançada (AGEs). Esses AGEs são formados pela ligação não enzimática (glicação) do composto dicarbonílico a proteínas, resultando na perda de função das mesmas. Os AGEs interagem com seu receptor (RAGE), desencadeando uma cascata de eventos intracelulares, incluindo o aumento da geração de espécies reativas de oxigênio (EROs) e ativação do sistema Rho-quinase. Além disso, ocorre a glicação de proteínas de matriz extracelular, como colágeno, que pode estar implicada na gênese da DBD. Os objetivos deste trabalho foram avaliar os efeitos do metilglioxal nas alterações morfológicas, moleculares e funcionais da bexiga em camundongos. Também buscamos avaliar se abordagens terapêuticas para eliminação do MGO refletem na melhora da disfunção da bexiga causada por MGO/AGEs. Para isso, utilizamos a metformina e o cloreto de alagebrium. Na primeira parte do estudo, investigamos os efeitos da administração crônica de MGO (na concentração de 0,5%, por 12 semanas) em camundongos saudáveis, fêmeas, da linhagem C57BL6. Na segunda parte, analisamos os efeitos de fármacos limitantes do MGO, utilizando a metformina (300 mg/kg, 2 semanas) em camundongos saudáveis, machos, da linhagem C57BL6. Além disso, empregamos um modelo animal de DM 2, utilizando camundongos deficientes de leptina ob/ob, machos e fêmeas, e administrando cloreto de alagebrium (ALT-711; "inibidor" de AGE). Realizamos testes para avaliar a função miccional in vivo (ensaio do papel de filtro em animais acordados e cistometria de enchimento em animais anestesiados), contratilidade detrusora in vitro e avaliação de alterações do eixo MGO-AGE-RAGE por meio de estudos moleculares (ELISA, western blotting, RT-PCR e imuno-histoquímica) no soro e bexiga dos animais. Investigamos a participação do canal iônico de potencial receptor transitório (TRPA1) nas alterações vesicais produzidas pela ativação do eixo MGO-AGE-RAGE e geração de EROs, bem como a ativação da Rho-quinase. O acúmulo sérico de MGO elevou os níveis dos AGEs e ativou a sinalização RAGE-EROs, levando à sensibilização muscular induzida pela Rho-quinase e à hiperatividade detrusora. A ativação do TRPA1 no urotélio pelo MGO causou bexiga hiperativa. O tratamento dos animais com metformina reduziu os níveis de MGO e de AGE, bem como as alterações histológicas e funcionais da bexiga em animais tratados com MGO, sugerindo que a melhora da disfunção miccional pela metformina depende de sua capacidade de eliminar MGO, evitando seu acúmulo no sangue. No modelo animal ob/ob, machos e fêmeas, detectamos níveis significativamente elevados de MGO, AGEs totais, AGEs fluorescentes (F-AGEs), hidroimidazolona (MG-H1) e colágeno no soro e/ou bexigas em comparação com o grupo magro. Camundongos ob/ob apresentaram disfunção miccional (ensaio do papel de filtro). O tratamento com ALT-711 reduziu significativamente os níveis de MGO, AGEs, RAGE e conteúdo de colágeno em camundongos ob/ob, mostrando que a quebra dos AGEs e diminuição do MGO está implicada na DBD do animal ob/ob. Os níveis aumentados de MGO no soro e, consequentemente, dos AGEs, levam ao aumento da expressão de RAGE na bexiga, evidenciando um importante papel do eixo MGO > AGEs > RAGE na DBD. Fármacos eliminadores de MGO e de AGEs podem ser estratégias importantes para melhorar ou minimizar a DBD causada pela ativação desse eixo.