A tese trata da categoria de libertação (Befreiung) nos textos originais de Karl Marx,
em passagens selecionadas nos 43 volumes em alemão da MEW – Karl Marx, Friedrich
Engels, Werke (Berlim: Dietz Verlag), publicados até junho de 2023. Essas passagens foram
cotejadas, conforme o caso, com os respectivos originais em inglês, publicados na MECW –
Marx & Engels Collected Works (Londres: Lawrence & Wishart), ou em francês, inglês e
alemão publicados na MEGA² – Marx-Engels Gesamtausgabe (Berlim: Akademie Verlag e
Dietz Verlag Berlin). A pesquisa investigou todas as ocorrências do radical composto “befrei-”
no conjunto da MEW, identificando a articulação recorrente de termos com significado de
libertação com alguns outros em particular. A partir disso, foi gerado um mapeamento lógico
das categorias primárias e secundárias relacionadas à libertação. O estudo sistematizou os
conteúdos das passagens principais, conectando-os entre si, e explicitou diferentes extensões e
compreensões dessa categoria em seu emprego por Marx no conjunto de sua obra. A pesquisa
mostrou que a categoria de libertação é central na trajetória da elaboração do autor e que a sua
articulação recorrente e consistente com outras categorias primárias e secundárias confere
unidade e coerência ao seu pensamento ao tratar da libertação em áreas diversas, sob distintos
aspectos; a pesquisa possibilitou, especialmente, conectar de modo orgânico o conjunto dessas
elaborações por suas próprias interfaces analíticas e estratégicas. Posto que toda libertação
requer os meios de sua realização, cuja produção está socialmente condicionada, tem-se por
consequência a impossibilidade da autolibertação dos indivíduos isoladamente; por outra
parte, dado o caráter contraditório das sociedades de classe, é igualmente impossível a
libertação de todos os seres humanos em conjunto, de uma só vez. Para o autor, a supressão da
privação dos meios necessários à realização das liberdades de todos e de cada qual é
efetivada, progressivamente, com a livre associação comunal dos trabalhadores que,
apropriando-se das forças produtivas, libertam o seu potencial na criação abundante de meios
de produção e de consumo para o atendimento das necessidades das comunidades humanas,
contando com as capacidades de cada qual em proveito do livre desenvolvimento das
individualidades de todos. Em sua abordagem, o mesmo movimento intrínseco de
expropriação capitalista, gerador de monopólios, segue operando nessa última fase, em que a
produção cooperativada, libertando o potencial das forças produtivas, avança
progressivamente na expropriação dos expropriadores, atendendo a volumes crescentes de
demandas sociais com a reprodução ampliada do valor econômico. Ocorre assim a libertação
do valor, do trabalho e da indústria, em movimento histórico similar ao do fenecimento do
sistema feudal e ao surgimento do capitalismo, porém agora na transição do sistema
capitalista ao sistema comunal, mediado pelo socialismo como fase intermédia. Nesse
movimento tem-se, progressivamente, a abolição do mercado e do Estado, por serem
mediadores da alienação econômica e política das comunidades humanas; e, em seu lugar,
firma-se o poder público (öffentliche Gewalt) não-estatal, assentado no poder econômico e
social dessas comunidades (Gemeinwesen), onde se realiza efetivamente a universalidade da
natureza humana comunal. Desse modo, a libertação das forças produtivas, com o
desenvolvimento científico e tecnológico aplicado à economia, não somente avança na
libertação do tempo humano de trabalho, isto é, na expansão do tempo livre (freie Zeit) para
todos, como consolida as bases materiais para a realização das liberdades individuais e
públicas, asseguradas por novas formações sociais de natureza democrática, organizadas
livremente, que superam a contradição entre as classes sociais e conduzem à abolição destas.