Introdução: O hipotireoidismo congênito (HC) é a principal causa de retardo mental evitável no mundo, o qual afeta em média 1:2000 a 1:2500 recém-nascidos vivos. O diagnóstico é estabelecido pela dosagem do TSH neonatal (TSHn) do 3º ao 5º dia de vida. O valor de corte do TSHn adotado pelo Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) para rastreamento do HC no Brasil é de 10 mU/L. No entanto, tem sido debatido se a redução deste valor poderia aumentar a sensibilidade para detecção de casos passíveis de tratamento não diagnosticados com o valor atual. Objetivo: Comparar dois valores de corte do TSHn (5mU/L vs. 10 mU/L) para rastreamento do HC. Casuística e métodos: Coorte retrospectiva através da análise dos prontuários de crianças com TSHn ≥ 5 mU/L, provenientes da região de Marília – SP, em seguimento no ambulatório de HC do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Marília , no período de janeiro de 2012 a dezembro de 2017. As crianças incluídas foram divididas em dois grupos de acordo com o valor de corte do TSHn, denominados Grupo 1 (G1: TSHn 5 – 9,9 mU/L) e Grupo 2 (G2: TSHn ≥10 mU/L). Comparou-se as taxas de falsos-positivos, de disgenesias tireoidianas (diagnosticadas pelo ultrassom em crianças ≥ 2 anos) e dos desfechos clínicos após suspensão da levotiroxina aos 3 anos de idade (HC permanente ou transitório). Resultados: Um total de 191 crianças foram incluídas neste estudo, com idade média na inclusão de 3,4 ± 3,05 ano, sendo 81 (42,2%) do sexo feminino e 110 (57,6%) do sexo masculino. De acordo com o valor do TSHn, 150 crianças (78,5%) foram categorizadas no G1 e 41 (21,5%) no G2. Os valores médios do TSHn foram de 6,5 ± 1,2 mU/L e 57,4 ± 89,8 mU/L, respectivamente nos G1 e G2 (p = 0,0001), enquanto os valores do TSH confirmatório foram de 8,8 ± 14,1mU/L e 63,1 ± 114,9 mU/L, nos G1 e G2 (p 0,0001), respectivamente. As taxas de diagnóstico falso-positivo foram significativamente elevadas no G1 comparadas ao G2 (46% vs. 14%, p =0,0001), mas ao contrário do esperado, as taxas de disgenesias tireoidianas (33,3% vs. 46,6%; p = 0,23) e de HC permanente (61,3% vs. 81,8%; p = 0,11) não foram estatisticamente diferentes entre os grupos G1 e G2, respectivamente. Conclusões: Os resultados deste estudo mostram que a redução do valor de corte do TSHn associou-se com aumento significativo da taxa de diagnóstico falso- positivo, mas permitiu a detecção de 19/31 crianças (61,3%) com HC permanente e 17/51 (33,3%) com disgenesias tireoidianas, as quais não seriam diagnosticadas e tratadas com o valor de corte superior, sugerindo necessidade de revisão do valor de corte do TSHn recomendado pelo PNTN.