Esta tese tem por objetivo reconstituir, sob uma perspectiva sociológica, as trajetórias de pesquisadoras e pesquisadores inseridos em diferentes contextos geracionais, dinâmicas institucionais e campos disciplinares que, em seus espaços de atuação, se identificam como agentes sociais engajados na construção da agroecologia como um campo específico de produção e circulação de conhecimentos. A partir dessas trajetórias profissionais, o trabalho busca refletir sobre as crenças compartilhadas, práticas e relações que conformam uma comunidade epistêmica referenciada na agroecologia no Brasil. Para tal, amparamo-nos nas contribuições da Sociologia da Ciência e dos Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia, com vistas a compreender os paradigmas e visões de mundo que orientam as práticas de ensino, pesquisa e extensão conduzidas por estes pesquisadores (as), as relações e jogos de força presentes no campo científico, bem como as dinâmicas de coprodução estabelecidas entre ciência e política nas práticas cotidianas desses sujeitos. Como recorte metodológico, iniciamos a investigação a partir de uma análise quantitativa dos grupos de pesquisa registrados junto ao Diretório dos Grupos de Pesquisa (DGP), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), principal agência de fomento à pesquisa no país, tendo como referência o ano de 2019. Encontramos 423 grupos de pesquisa distribuídos em diferentes universidades, institutos federais, fundações, empresas, agências, entre outras instituições em todo o país, que estão ligadas, diretamente, à temática da agroecologia. Considerando este universo, realizamos 25 entrevistas com interlocutores (as)individuais que foram selecionados com foco na diversidade da amostra, baseando-se seguintes critérios: geração, áreas de pesquisa, instituição a qual o pesquisador(a) está vinculado e região de atuação. No tocante à observação participante, acompanhamos duas edições do Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA), a saber, a edição que ocorreu em Brasília-DF, em setembro de 2017 e a que foi realizada em Aracaju-SE, em novembro de 2019. Os resultados da pesquisa evidenciam que a agroecologia conforma uma comunidade epistêmica de caráter inter-transdisciplinar. Não há um perfil único que enquadre os (as) pesquisadores (as) agroecológicos. As pessoas que compõem esta comunidade epistêmica são oriundas de diferentes disciplinas científicas, vivenciando a produção de conhecimentos em agroecologia a partir de um conjunto diversificado de práticas e formas de engajamento. Existem alguns princípios e conceitos comuns, que identificam esta comunidade, como, por exemplo, a crítica aos modos de organização da agricultura e do sistema agroalimentar nas sociedades contemporâneas, o diálogo de saberes, a referência ao conceito de agroecossistema e as conexões estabelecidas entre ambiente e sociedade no estudos das tecnológicas relações que vinculam agricultura e alimentação nos espaços urbanos e rurais e no desenvolvimento de alternativas sociais e tecnológicas voltadas à transformação da agricultura e do sistema agroalimentar. Mas é preciso considerar que, mesmo estes conceitos, são acionados a partir de arranjos muito diferenciados, potencializando várias formas de fazer ciência e de construir relações para além da academia. As trajetórias percorridas pelos pesquisadores e pesquisadoras agroecológicos envolvem, ainda, diferentes formas de mediação entre projetos individuais e institucionais. Tais projetos não se dão num vazio social, mas são informados por circunstâncias socioeconômicas e políticas. A constituição de uma comunidade epistêmica referenciada na agroecologia é, assim, influenciada pelas condições que cada espaço institucional e período histórico incitam, viabilizam e oportunizam, o que implica em jogos de poder em que interesses, recursos e formas de organização da agricultura e do sistema agroalimentar estão em disputa.